quinta-feira, 4 de junho de 2009

EU PISAVA NOS CRISTAIS DISTRAIDA

Eu pisava nos Cristais Distraída.

Verônica Aroucha


Como poderia ter se modificado tanto? Não foi uma mudança qualquer, uma alteração nos gestos. Foi uma mudança no limite, isso. Não, nenhuma palavra exprime aquele novo estado de ser.

Não dei por mim quando mudei. O lenço era mais comprido do que o véu da noiva. Mas era salgado onde lágrimas pareciam minúsculos cristais. Estavam enxutas, finalmente. Quando o Sol batia sobre eles, quem os vissem diriam que eram Estrelas de cores variadas – azul, rosa, verde, laranja.

Quem já viu um Arco-íris assim? Menina chorona de riso fácil. Agora as lágrimas eram mais da natureza do que do sentimento. Chuva de Caju. Seu coração desertificou, sem dar na vista, não sabia que ficaria como alguém que já se foi. Não lhe cabia um lugar qualquer.

A mobília da sala parecia-lhe tão ridícula. Detestava a monotonia das flores plásticas, plácidas e indiferentes.

Às vezes, desconfiava se existia mesmo, tanto lhe palpitava a vida, entrando pelos poros na mesma intensidade de quando escorre o suor após a exaustão da alegria. Cada minuto, cada hora desfilavam em cima da minha alma com a nitidez de um relógio de parede, que toca para avisar do tempo.

O tempo para cá já é outro e não importa mais. Escuto uma música, Bolero de Ravel e um frêmito tomam conta de mim.

Tudo isto acontece, como já disse, porque virei um deserto onde tenho um espaço imenso para correr e encontrar as flores.